Presidente da CEE (Comissão Especial de Estudos) que acompanha a situação das filas do SUS em Ribeirão Preto, o vereador Marcos Papa (Rede) defende intervenção na Secretaria Municipal de Saúde e cogita transformar a CEE em CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). As declarações foram feitas durante reunião nesta quinta-feira (29).

As últimas oitivas realizadas com médicos e usuários do SUS reforçaram a existência de grandes deficiências no setor e a necessidade de mudanças imediatas, como reforma administrativa, investimentos no atendimento básico e informatização de todo o sistema.

“Se o interventor não estiver sendo o secretário de Saúde, que tem qualificação para fazer uma intervenção profunda numa reforma administrativa na Secretaria de Saúde, o prefeito tem que resolver. A população não pode aguentar mais jogo de empurra. Nós estamos diante de fatos reais, de pessoas expostas a riscos de morte, expostas a riscos de agravamento promovido pela própria Secretaria de Saúde”, criticou Marcos Papa.

O presidente da CEE ainda complementou: “Talvez tenhamos que transformar essa Comissão Especial de Estudos em CPI para podermos convocar autoridades, exigir documentos e eventualmente até mesmo responsabilizar por improbidade. O que não podemos aceitar é que a população continue desatendida, sofrendo e morrendo nas filas”.

16 meses na fila
As declarações de Marcos Papa sucederam depoimento de Cássia Aparecida Beraldo, moradora do bairro Geraldo de Carvalho, paciente na UBS do Marincek. Cássia disse aguardar uma consulta com cirurgião vascular há um ano e quatro meses. A munícipe, que é diabética, afirmou que, no pedido de regulação, o médico alertou para alta prioridade. Ela ainda classificou como “de péssima qualidade” as seringas e agulhas distribuídas aos diabéticos pela rede municipal. O material apresentado foi juntado aos autos da CEE.

A depoente apresentou à CEE fotos de bancos quebrados e uma relação de remédios que estariam em falta na UBS do Marincek, semana passada, como o ácido fólico. Membro da comissão, o vereador e médico Luciano Mega disse que a falta de ácido fólico nos primeiros meses de uma gestante podem resultar em bebês com hidrocefalia e mielomeningocele.

“Uma unidade de saúde expondo a população a doenças incuráveis. Olhem o estado que deixaram a nossa cidade. Se a prefeitura não tem mais falta de dinheiro, no caso da falta de medicamentos, é uma falha de gestão. É muito grave o que estamos ouvindo aqui”, atacou o presidente da CEE.

Em depoimento à CEE também na última quinta-feira, o munícipe Ruy Rego Barros, que é paciente na UBS da Vila Albertina, declarou aguardar uma ultrassonografia das pernas há seis meses. Barros disse precisar do resultado do exame para agendar o retorno ao médico especialista que marcará a cirurgia. Não há previsão.

Crédito da foto: Allan S.Ribeiro / Comunicação da Câmara

Fábrica de gargalos
Durante oitiva do médico Eduardo Fernando Gonçalves, também na última quinta, foram identificados mais dois gargalos nas filas do SUS: o impedimento dos médicos das UBSs para solicitação de exames, como endoscopia e alguns tipos de ultrassonografia, e a ausência de prontuários no retorno do atendimento secundário para o básico.

“Temos uma fábrica de gargalos na rede municipal. O médico da atenção básica não pode pedir um exame que ele está vendo que o paciente precisa fazer, então é obrigado a encaminhá-lo para um especialista. Quando esse paciente é atendido pelo especialista, depois de aguardar sabe Deus quanto tempo, faz os exames necessários, mas quando ele volta para a atenção primária, para a UBS do seu bairro, esse paciente muitas vezes não sabe dizer para o seu médico quais exames foram feitos a pedido do especialista e nem mesmo o diagnóstico. Essa situação relatada é absurda!”, atacou Marcos Papa.

O presidente da CEE propôs uma indicação para que o governo adote a obrigatoriedade dos atendimentos via prontuário eletrônico e ainda acrescentou: “No caso da proibição de determinados exames a secretaria cria um gargalo desnecessário por desconfiar do próprio médico que ela contrata para trabalhar. Diante de tudo que ouvimos podemos dizer que a situação é macabra porque tem gente morrendo na saúde pública de Ribeirão”.

Gonçalves afirmou que Ribeirão Preto conta atualmente com 45 equipes de saúde da família quando necessitaria ter entre 150/200 equipes. O depoente ainda declarou que muitos munícipes abrem mão de planos de saúde quando a equipe de saúde da família faz um atendimento acolhedor.

Foto: Aline Pereira / Comunicação da Câmara

Atenção básica
Em depoimento à CEE das Filas do SUS, no dia 1° de março, as especialistas Sônia Mara Neves Ferri, Adriana Mafra Brienza e Maria do Carmo Gullaci Guimarães Caccia-Bava fizeram coro para defender o fortalecimento da atenção básica, cuja resolubilidade atualmente é baixa em Ribeirão Preto, como forma de resolver as filas das especialidades.

Maria do Carmo declarou ter feito um estudo que mostrou que das 10 mil consultas/mês realizadas na UBDS do Sumarezinho, oito mil não deveriam ter sido realizadas na unidade por não se enquadrarem em serviço de pronto-atendimento. A disponibilidade de tecnologia (exames de urgência no local), vínculo com os profissionais da unidade e o horário de funcionamento estendido justificariam a “preferência”.

Ainda segundo a especialista, o município está em total desacordo com a Portaria Nacional da Saúde que diz que do total de consultas realizadas 63% deveriam ser na atenção básica, 22% na especializada e 15% no pronto atendimento. Em Ribeirão Preto, o pronto atendimento giraria em torno de 45%.

As depoentes também relataram que os moradores da área central estão descobertos de atenção básica. Outro gargalo identificado pelas especialistas diz respeito às guias de papel e a falta de informatização principalmente na fase terciária/prestadores de serviço. Um relatório solicitando a informatização e integração de todo o sistema foi entregue, segundo as depoentes, ao atual governo durante o período de transição.

“Presumo que o problema na rede municipal de saúde não seja falta de tecnologia, então estamos oficiando o governo para que nos ajude a entender qual é a limitação técnica existente ou se é falta de vontade política”, enalteceu Marcos Papa.

Crédito da foto: Allan S.Ribeiro / Comunicação da Câmara